sexta-feira, setembro 29, 2006
Manual de um tolo
I
Tem dias, que para não dizer ou fazer algo;
há que morder os lábios, mastigar a língua,
amputar dedos, mãos, braços;
abrir nova sepultura
enterrar tudo cá dentro;
há dias condenados ao silêncio.
II
Chegada a hora de trancar portas,
fechar janelas,
quebrar todos os espelhos e vidros,
apagar luzes e outras tantas esperanças;
tornar-se o ponto mais escuro da escuridão.
III
De repente arrombam-se as portas,
estilhaçam-se janelas,
rasga-se a roupa e saio para a rua nu;
então grito, berro estridentemente,
choro, soluço e morro feliz dobrado sobre mim.
António Morgado
I
Tem dias, que para não dizer ou fazer algo;
há que morder os lábios, mastigar a língua,
amputar dedos, mãos, braços;
abrir nova sepultura
enterrar tudo cá dentro;
há dias condenados ao silêncio.
II
Chegada a hora de trancar portas,
fechar janelas,
quebrar todos os espelhos e vidros,
apagar luzes e outras tantas esperanças;
tornar-se o ponto mais escuro da escuridão.
III
De repente arrombam-se as portas,
estilhaçam-se janelas,
rasga-se a roupa e saio para a rua nu;
então grito, berro estridentemente,
choro, soluço e morro feliz dobrado sobre mim.
António Morgado
quinta-feira, setembro 21, 2006
Amor Carnal
Apesar dos olhares,
Das bocas onde os silêncios se calam
E tudo é seu,
Amordaçavam o desejo, mordiam os lábios;
Dois enormes couraçados contra novas ilusões.
E se fossem apenas carne?
Devorar-se-iam
Um ao outro eternamente,
Vertendo-se mutuamente;
Pés, peito, pele,
Coxas, línguas, sexos;
Carne sobre carne.
Até ao dia em que alguém
Já cheio de indiferença,
Os resolve-se punir e premiar;
Lhes colocaria um espeto
E acabariam expostos na vitrina
De um talho qualquer.
António Morgado
Apesar dos olhares,
Das bocas onde os silêncios se calam
E tudo é seu,
Amordaçavam o desejo, mordiam os lábios;
Dois enormes couraçados contra novas ilusões.
E se fossem apenas carne?
Devorar-se-iam
Um ao outro eternamente,
Vertendo-se mutuamente;
Pés, peito, pele,
Coxas, línguas, sexos;
Carne sobre carne.
Até ao dia em que alguém
Já cheio de indiferença,
Os resolve-se punir e premiar;
Lhes colocaria um espeto
E acabariam expostos na vitrina
De um talho qualquer.
António Morgado
Lua e Flor
Eu amava como amava algum cantor
De qualquer cliché de cabaré de lua e flor
Eu sonhava como a feia na vitrine
Como carta que se assina em vão
Eu amava como amava um sonhador
Sem saber porque que amava ter no coração
A certeza ventilada de poesia
De que o dia amanhece não
Eu amava como amava um pescador
Que se encanta mais com a rede que com o mar
Eu amava como jamais poderia se soubesse
Como te encontrar
Oswaldo Montenegro
Eu amava como amava algum cantor
De qualquer cliché de cabaré de lua e flor
Eu sonhava como a feia na vitrine
Como carta que se assina em vão
Eu amava como amava um sonhador
Sem saber porque que amava ter no coração
A certeza ventilada de poesia
De que o dia amanhece não
Eu amava como amava um pescador
Que se encanta mais com a rede que com o mar
Eu amava como jamais poderia se soubesse
Como te encontrar
Oswaldo Montenegro
POEMA 7
Inclinado en las tardes tiro mis tristes redes
a tus ojos oceánicos.
Allí se estira y arde en la más alta hoguera
mi soledad que da vueltas los brazos como un náufrago.
Hago rojas señales sobre tus ojos ausentes
que olean como el mar a la orilla de un faro.
Sólo guardas tinieblas, hembra distante y mía,
de tu mirada emerge a veces la costa del espanto.
Inclinado en las tardes echo mis tristes redes
a ese mar que sacude tus ojos oceánicos.
Los pájaros nocturnos picotean las primeras estrellas
que centellean como mi alma cuando te amo.
Galopa la noche en su yegua sombría
desparramando espigas azules sobre el campo.
Pablo Neruda
Inclinado en las tardes tiro mis tristes redes
a tus ojos oceánicos.
Allí se estira y arde en la más alta hoguera
mi soledad que da vueltas los brazos como un náufrago.
Hago rojas señales sobre tus ojos ausentes
que olean como el mar a la orilla de un faro.
Sólo guardas tinieblas, hembra distante y mía,
de tu mirada emerge a veces la costa del espanto.
Inclinado en las tardes echo mis tristes redes
a ese mar que sacude tus ojos oceánicos.
Los pájaros nocturnos picotean las primeras estrellas
que centellean como mi alma cuando te amo.
Galopa la noche en su yegua sombría
desparramando espigas azules sobre el campo.
Pablo Neruda
This Is a Photograph of Me
It was taken some time ago.
At first it seems to be
a smeared
print: blurred lines and grey flecks
blended with the paper;
then, as you scan
it, you see in the left-hand corner
a thing that is like a branch: part of a tree
(balsam or spruce) emerging
and, to the right, halfway up
what ought to be a gentle
slope, a small frame house.
In the background there is a lake,
and beyond that, some low hills.
(The photograph was taken
the day after I drowned.
I am in the lake, in the center
of the picture, just under the surface.
It is difficult to say where
precisely, or to say
how large or small I am:
the effect of water
on light is a distortion
but if you look long enough,
eventually
you will be able to see me.)
Margaret Atwood
It was taken some time ago.
At first it seems to be
a smeared
print: blurred lines and grey flecks
blended with the paper;
then, as you scan
it, you see in the left-hand corner
a thing that is like a branch: part of a tree
(balsam or spruce) emerging
and, to the right, halfway up
what ought to be a gentle
slope, a small frame house.
In the background there is a lake,
and beyond that, some low hills.
(The photograph was taken
the day after I drowned.
I am in the lake, in the center
of the picture, just under the surface.
It is difficult to say where
precisely, or to say
how large or small I am:
the effect of water
on light is a distortion
but if you look long enough,
eventually
you will be able to see me.)
Margaret Atwood
terça-feira, setembro 05, 2006
Rosa
hoje o céu está mais azul
eu sinto
fecho os olhos,
mesmo assim
eu sinto
o meu corpo estremecer
não consigo adormecer
Amor
nem o tempo vai chegar
pra dizer o quanto eu sinto
você longe de mim
é uma espécie de dor
hoje o céu está mais azul
eu sinto
olho à volta,
mesmo assim
eu sinto
que este amor vai acabar
e a saudade vai voltar
Amor
nem o tempo vai chegar
pra dizer o quanto eu sinto
você longe de mim
é uma espécie de dor
já não sei o que esperar
dessa vida fugidia
não sei como explicar
mas é mesmo assim o Amor
Rodrigo Leão
hoje o céu está mais azul
eu sinto
fecho os olhos,
mesmo assim
eu sinto
o meu corpo estremecer
não consigo adormecer
Amor
nem o tempo vai chegar
pra dizer o quanto eu sinto
você longe de mim
é uma espécie de dor
hoje o céu está mais azul
eu sinto
olho à volta,
mesmo assim
eu sinto
que este amor vai acabar
e a saudade vai voltar
Amor
nem o tempo vai chegar
pra dizer o quanto eu sinto
você longe de mim
é uma espécie de dor
já não sei o que esperar
dessa vida fugidia
não sei como explicar
mas é mesmo assim o Amor
Rodrigo Leão